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Tortura: "... o primeiro passo é quebrar o muro do silêncio".

29-06-2004

Artigo de Alain Aeschlimann, chefe da Agência Central de Busca e Divisão de Proteção do Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV), por ocasião do dia internacional em favor das vítimas da tortura, 26 de junho.

A simples eloquência desta frase demostra o que, para o CICV, sempre esteve no coração do seu trabalho com as pessoas privadas de liberdade: o foco em sua situação e em suas necessidades.

O muro de silêncio ao redor de prisioneiros pode ser visto de duas formas: a primeira é a existência de pessoas detidas em situações de conflito armado ou distúrbios internos cuja existência pode ser ocultada ou posta em dúvida pelas autoridades responsáveis, como um meio de aumentar a pressão sobre elas e suas famílias e comunidades.

A segunda é o silêncio no qual os próprios prisioneiros podem enclausurar-se após ter sofrido tratamentos físicos e psicológicos terríveis. Em inúmeros casos, muitas vezes agravados por variáveis culturais, pode ser difícil, em alguns casos até impossível para eles falarem com companheiros de detenção, parentes ou amigos sobre os tratamentos a que foram submetidos, mesmo que, ou talvez exatamente porque os outros tenham enfrentado as mesmas bararidades.

O CICV, que se esforça para prevenir e pôr fim à tortura (assim como a outros maus-tratos descritos de diferentes maneiras nas Convenções de Genebra de 1949 e seus Protocolos Adicionais de 1977 como " cruéis " , " humilhantes " e " degradantes " ), concentra sua ação sobre a experiência e o testemunho dos detidos. Derrubar o muro de silêncio é a primeira etapa deste que pode ser um processo penoso (e penosamente lento) que tem como objetivo, através de gestões incessantes frente às autoridades responsáveis, fazer cessar tais atos.

O papel do CICV neste processo consiste em dialogar com as vítimas da maneira mais profunda possível sem ser percebido como " interrogador " , redigir relatórios detalhados, questionar as autoridades competentes por medidas cabíveis e repetir as visitas tantas vezes quanto seja necessário para assegurar que os melhoramentos sejam feitos. Tudo isso demanda muita paciência.

A convenção das Nações Unidas contra a tortura e outras penas ou tratamentos cruéis, inumanos ou degradantes, assinada em 1984 e posta em vigor em 26 de junho de 1987, assim como outros tratados regionais, têm como objetivo fazer com que este que deve ser considerado como um dos direitos mais evidentes – o direito a não ser torturado – seja escrito na lei, que reflete a vontade do povo.

Nos conflitos armados, quando tantas outras regras do direito são restringidas ou completamente ignoradas, as Convenções de Genebra dizem claramente que mesmo a guerra tem limite.

E portanto ...

Estes tratados demandam aos estados – como no artigo 127 da III Convenção de Genebra – incorporar o estudo do Direito Internacional Humanitário nos programas de instrução militar afim de que as pessoas que vestem uniformes não possam dizer que " não sabiam ... " .

As vítimas da tortura – que em sua maior parte não gozam do triste privilégio da cobertura midiática dispensada às pessoas torturadas no Iraque – esperam saber quando estes tratados serão plenamente implementados e quando entrarão em vigor.

  **International Reponses to Traumatic Stress, chapter 7: How visits by the ICRC can help prisioners cope with the effects of traumatic stress, por Pascal Daudin e Hernan Reyes (Baywood Publishing Company Inc., 1996, somente em inglês) – ler este documento.

    Veja também, em francês, La torture et ses conséquences, por Hernan Reyes (também em espanhol)