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Madagascar: voluntários da Cruz Vermelha em alerta em meio à crescente tensão

13-03-2009 Reportagem

Em meio à crescente ameaça de violência em Madagascar, a Cruz Vermelha malgaxe continua mobilizando equipes de voluntários a socorristas em toda a ilha, preparados para tratar e evacuar feridos durante as manifestações políticas. A seguir, um relato direto da capital, Antananarivo.

     

    © Malagasy Red Cross      
   
    Antananarivo, Madagascar. Uma pessoa gravemente ferida é transferida em um veículo da Cruz Vermelha para evacuação para o hospital.      
         

Em um pequeno pátio manchado de óleo, atrás do escritório nacional da Cruz Vermelha malgaxe, as ambulâncias são limpas e estão preparadas para mais um dia de trabalho. Dezenas de voluntários, com seus novos coletes, impecavelmente brancos com o emblema da Cruz Vermelha malgaxe, estão trabalhando: mudando de lugar as caixas com kits de vestimentas, carregando o caminhão, conferindo o material dos veículos.

A maioria deles estava a postos desde as 9 horas, mas a marcha da oposição está marcada para o meio-dia e chegou a hora de organizar e distribuir as equipes em pontos estratégicos pré-posicionados em Antananarivo, a capital deste mini-continente no Oceano Índico.

Tana, como a cidade é conhecida, tem sido o cenário de um confronto político desde meados de janeiro, quando começaram as manifestações nas quais se opõem os que apóiam do chefe de Estado contra os partidários do prefeito da cidade, que foi deposto. Nas semanas seguintes, protestos e greves haviam se tornado rotina, com ocasionais violência, saques, queimas e tiros que deixaram vários mortos e feridos. Toques de recolher noturnos também foram impostos.

Nesta situação tensa, a Cruz Vermelha malgaxe tem estado sempre presente para socorrer as vítimas, com equipes a postos para os casos de violência ou espalhadas em postos de primeiros socorros próximos aos pontos programados para a concentração e as marchas. O CICV, desde seu escritório em Tana, tem apoiado a Cruz Vermelha local com material de primeiros socorros, macas e lençóis, mas são a equipe e os voluntários que dão o elemento humano vital: pessoas com a missão de ajudar.

  Doando seu tempo e suas habilidades  

Os voluntários da Cruz Vermelha, como se descobriu depois, possuem experiências distintas. Alguns poucos fizeram uma pausa para falar de si e contar porque abrem mão de seu tempo para estarem aí em uma ensolarada manhã de sábado.

Rado afirma que é lojista. É voluntário da Cruz Vermelha há dois anos. Ele gosta do treinamento que recebe e agora é instrutor comunitário de higiene e saneamento, além de socorrista. Rado estava de plantão no dia em que vários manifestantes foram baleados.

A motivação e a preocupação de Alice são mais tradicionais: ela quer ajudar as pessoas que sofrem. Durante um ano ela esteve envolvida em um projeto da Cruz Vermelha local de educação sobre água e saneamento e de treinamento de jovens, mas não hesitou em oferecer suas habilidades como socorrista quando a situação ficou complicada.

Alice deixou em casa os filhos e o marido, que se preocupam que ela esteja fora de casa nesses dias violentos. Mas ela fez sua escolha e está ansiosa para voltar ao trabalho de preparação com os outros voluntários. Tanto ela como Rado estão a postos ou ajudando os feridos seis dias por semana no último mês. Ambos parecem preparados para continuar colaborando enquanto for necessário.

  Admirados pela comunidade  

     

    © Malagasy Red Cross      
   
    Antananarivo, Madagascar. Voluntários da Cruz Vermelha malgaxe evacuam uma vítima durante as manifestações em Antananarivo.      
         

A motivação deles aumenta pelo fato de o trabalho na Cruz Vermelha ter sido destacado pela imprensa local: afinal, a organização é a única a prestar primeiros socorros e a levar os feridos ao hospital durante as atuais tensões. Os hospitais a elogiam e até mesmo as comunidades expressam sua admiração pelos esforços dos voluntários.

Um líder da equipe de primeiros socorros conta, envergonhado, que agora para ele é difícil fazer a fila para comprar o pão. " As pessoas me fazem passar a frente, dizendo'Esse cara é da Cruz Vermelha, deixem passar'" .

Njaka pagou por um curso de primeiros socorros em 2004, mas voltou para a Cruz Vermelha como voluntário em janeiro. A organização deu a ele e a outros a chance de ajudar e de fazer a diferença, sem tomar partido na disputa política. Por isso ele está aqui. Seu pai está feliz e sua mãe está preocupada, mas de uma maneira ou de outra, Njaka estará aí todos os dias que precisarem dele. Embora a espera se torne difícil, ele só voltará para seu verdadeiro trabalho - professor de natação – quando as coisas se acalmarem.

Podemos escutar gritos vindos do complexo da Cruz Vermelha: boas e más notícias. A marcha terminou pacificamente e as equipes estão retornando, mas outra manifestação já foi anunciada, desta vez em um dia incomum, um domingo, e, quem sabe, as coisas podem se complicar. Tanto a equipe quanto os voluntários estavam esperando por um tradicional e sonolento domingo em Tana.

As caixas são descarregadas; os coletes, devolvidos e registrados; as ambulâncias, fechadas; e os voluntários vão indo embora aos poucos, de volta para casa. " Até amanhã " , dizem, pensando no que o amanhã trará.