Artigo

Aleppo: cerca de 20 mil pessoas fugiram das suas casas nos últimos três dias

Ela bate os dentes de frio e as suas pequenas mãos buscam um pouco de calor nos bolsos do seu casaco amarelo gastado. Mas está sorrindo, brincando nos prédios bombardeados de Aleppo com os amigos.

Yousra tem seis anos e não conhece nada mais do que a guerra na sua curta vida. Ela e a guerra têm seis anos. Como tantas outras, a família dela foi obrigada a fugir de casa quando os enfrentamentos intensos chegaram ao bairro onde moravam.

Eles buscavam um lugar mais seguro e terminaram em um prédio praticamente arruinado, enfrentando dificuldades para sobreviver.

Yousra, 6 anos, e os amigos encontram um lugar em meio à destruição de Aleppo para brincar. CC BY-NC-ND / ICRC / Sana Tarabishi

Estima-se que cerca de 60 mil pessoas foram obrigadas a deixar as suas casas em Aleppo desde agosto. Somente das últimas 72 horas fugiram 20 mil. Muitas outras já haviam fugido antes.

Algumas pessoas vivem em abrigos, outras em mesquitas, escolas ou barracas. Há outras que encontraram refúgio em prédios inacabados ou destruídos. E algumas foram acolhidas por famílias que já viviam no limite para suprir as suas necessidades. Crianças e jovens, sobretudo depois do martírio que enfrentam, precisam e querem desesperadamente voltar à escola.

Muitas pessoas foram obrigadas a fugir duas ou três vezes à medida que as balas e bombas se aproximavam. No oeste de Aleppo, mais de 40 mil pessoas fugiram das áreas de confrontos ativos, primeiro no sudoeste de Ramousseh e depois no oeste da cidade, como os bairros de Nova Aleppo, Menyan e Al Hamdaniyeh.

No leste, os ataques intensificados nos bairros de Masakan Hananoo, Jabal Badro e Sakhour já obrigaram 20 mil pessoas a fugirem em diferentes direções em busca de um porto seguro. A maioria dessas pessoas são famílias, incluindo muitos bebês e crianças pequenas. A situação nos abrigos precários piora com a chegada do inverno e a queda da temperatura.

"As consequências de fugir de casa são imensas. Não é somente uma questão de juntar alguns poucos artigos e ir embora. Existe um efeito dominó importante. As pessoas precisam ter garantias de que poderão passar com segurança e de que terão condições dignas. Também precisam suprir as suas necessidades básicas de comida, água potável e atendimento médico", afirmou a chefe da delegação do CICV na Síria, Marianne Gasser, que atualmente está visitando abrigos em Aleppo.

Aleppo era uma cidade com mais de dois milhões de habitantes, mas com tantos confrontos e deslocamentos, é impossível precisar quantas pessoas ainda vivem lá hoje.

Os estoques de comida se esgotaram. Os preços aumentaram ou, como aconteceu no leste, dispararam. O custo dos alimentos frescos como frutas, verduras, leite e carne é astronômico. Um quilo de pimentão verde custa 14 dólares, mais de dez vezes o preço normal. Até mesmo os preços dos alimentos secos estão subindo: um quilo de açúcar custa impressionantes 21 dólares, quase dez vezes mais do que o preço médio no mercado, enquanto que por 50 centavos, um pequeno pão custa 15 vezes mais caro.
O CICV e o Crescente Vermelho Árabe Sírio fazem o possível para ajudar, colaborando com a melhora das condições dos abrigos, fornecendo alimentos e prestando atendimento médico, sempre que possível. Equipar e reformar poços também ajudou muito no abastecimento de água, principalmente quando a rede de água da cidade não está funcionando. Mas as necessidades são cada vez maiores e os confrontos em curso e a falta de segurança dificultam a entrega de mercadorias e os consertos.

"É vital que todos os lados respeitem os civis. Os estabelecimentos de saúde precisam ser protegidos já que muitos foram danificados e destruídos. Não podem ocorrer ataques indiscriminados. A dignidade humana deve ser respeitada sempre", declarou Gasser.

Existe também o sofrimento menos óbvio causado pelo deslocamento. As crianças praticamente não têm acesso a uma educação regular. Ademais dos danos psicológicos. Muitas pessoas vivem com diversas incertezas e medos durante tanto tempo. Os efeitos durarão anos.

"Estamos preparados para fazer mais. Organizar evacuações médicas, prestar mais apoio às pessoas que ficaram para trás. Mas precisamos ter mais acesso às pessoas onde quer que estejam", acrescentou Gasser. "Sem previsão de fim para o conflito ou de se alcançar a paz, milhares de outros civis enfrentam diariamente dificuldades para sobreviver."

Notas para os editores

O CICV no terreno em Aleppo:

  • Desde ontem, o CICV e o seu parceiro, o Crescente Vermelho Árabe Sírio, estão atendendo as necessidades das pessoas.
  • O CICV já aumentou a sua resposta conjunta com o Crescente Vermelho Árabe Sírio à medida que a situação se desdobra. A principal resposta se concentra no abrigo coletivo de Jibreen, no oeste de Aleppo, mas o CICV Continua fazendo o possível para chegar a outras áreas de onde as pessoas fugiram, incluindo bairros no lado leste.
  • As famílias fogem em meio ao caos dos confrontos, quase sempre com poucos ou nenhum pertence. Elas precisam garantias de poderão passar com segurança, assim como suprir as suas necessidades básicas de comida, água potável e atendimento médico.
  • A recente onda de deslocamento pôs uma pressão extra sobre os abrigos coletivos no oeste da cidade, que já estavam no limite, com a chegada de mais de 40 mil pessoas entre agosto e meados de novembro.
  • Desde o início dos confrontos em Aleppo, mais de 55 funcionários sírios e interacionais do CICV trabalhamos no terreno de maneia ininterrupta para atender as necessidades da melhor mais possível.