relatório de Tigray Ocidental e do norte de Amhara

Etiópia: relatório de Tigray Ocidental e do norte de Amhara

Em meados de novembro, após a primeira semana de combates no norte da Etiópia, uma equipe do Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) viajou para o norte de Amhara e Tigray Ocidental. Neste relatório, Wilson Modal, líder da equipe no terreno, descreve o ele e seus companheiros presenciaram.
Artigo 27 novembro 2020 Etiópia

Nossa equipe de seis pessoas viajou para o norte de Amhara e Tigray Ocidental, uma jornada que leva cerca de três dias. A missão tinha uma tripla finalidade: entender melhor as necessidades humanitárias; conversar com as autoridades; e distribuir remédios e suprimentos para os centros de assistência à saúde e as ambulâncias, que, segundo relatos, estavam lidando com um grande número de vítimas dos confrontos. Nossa equipe também visitou algumas pessoas detidas em conexão com o conflito e distribuiu artigos de higiene.

Pessoas deslocadas temem por suas vidas

No caminho para o norte de Amhara e Tigray Ocidental, passamos por um povoado destruído. Uma casa estava em chamas. A área estava completamente deserta.

Em Dansha, em Tigray Ocidental, encontramos pessoas que haviam sido deslocadas de suas casas e viviam em um campo improvisado sem alimentos, água nem cuidados médicos. Elas nos disseram que temiam por suas vidas e queriam sair da região de forma segura.

No lado da fronteira do norte de Amhara, em Abderafi, os deslocados tinham necessidades semelhantes. As pessoas com quem nos reunimos haviam fugido de suas fazendas nos arredores, deixando seus cultivos e suas casas para trás. Hoje, elas carecem de itens básicos – alimentos, água, assistência à saúde e abrigo.

Não temos cifras exatas sobre o número total de pessoas deslocadas de suas casas pelos combates no nordeste da Etiópia. Cerca de duas mil pessoas vivem em três campos nas áreas que visitamos, mas acreditamos que haja muitas outras nas regiões onde ainda não estivemos.

Ambulâncias sob fogo cruzado

Três ambulâncias da Cruz Vermelha da Etiópia foram atacadas desde o início dos confrontos. É um sinal extremamente preocupante de que os socorristas – e as pessoas que dependem deles para tratamento – não têm sido respeitados ou protegidos, o que pode ter terríveis consequências. Nas últimas semanas, essas ambulâncias transportaram centenas de pessoas feridas aos centros de saúde. Entregamos alguns kits de primeiros socorros à filial da Cruz Vermelha da Etiópia na região.

Estabelecimentos de saúde em Amhara

Observamos que centros de assistência à saúde no norte de Amhara ainda atendem feridos, mas em um ritmo mais lento que na primeira semana dos combates, quando recebiam entre 50 e 60 vítimas por dia. O número de pacientes que necessitam de atendimento de emergência diminuiu, mas a maioria dos estabelecimentos carece de remédios essenciais e material médico. Entregamos suprimentos de emergência a alguns centros de saúde essenciais para reabastecê-los e ajudá-los a manter o atendimento aos feridos.

Um desses centros é o Hospital Gonder, a principal referência na região, que também recebe pacientes com Covid-19. Isto mostra que a pandemia ainda está entre nós, apesar dos combates e de uma nova crise humanitária que começa a surgir.

Separados dos seres queridos

Em apenas três semanas, muitas pessoas foram separadas de suas famílias e precisarão de apoio em seus esforços para encontrá-las. As buscas se tornaram ainda mais difíceis porque as redes de telefonia e internet estão fora de serviço na região de Tigray, isolando os habitantes do mundo ao seu redor.

Já temos mais de 1,3 mil pedidos de pessoas na Etiópia e no exterior que tentam, de forma desesperada, retomar o contato com seus familiares. Sabemos que esta é somente a ponta do iceberg.

Alguns, tragicamente, já estão mortos. Recuperar os corpos será um enorme desafio, podendo deixar muitas famílias sem saber o que aconteceu com seus entes queridos.

Planejamento da nossa resposta

Hospitais e estabelecimentos de saúde no norte da Etiópia, dentro e ao redor de áreas onde houve intensos combates, precisam com urgência de material médico.

Entregamos suprimentos a centros de saúde no norte de Amhara e artigos de primeiros socorros à Cruz Vermelha da Etiópia, mas muitas necessidades urgentes permanecem.

Famílias deslocadas necessitam de alimentos, água e abrigo. Devemos providenciar imediatamente artigos de ajuda de emergência para as famílias, incluindo cobertores, colchões e galões.

À medida que os combates avançam para o leste, os estabelecimentos de saúde na região de Tigray necessitam de apoio para cuidar dos feridos. Outros hospitais estão ficando sem remédios e suprimentos para problemas médicos de rotina. As ambulâncias devem continuar fazendo seu trabalho, transportando os feridos das linhas de frente, e para isso precisam receber os kits de primeiros socorros.

As pessoas necessitam de ajuda para restabelecer o contato com seus entes queridos na região de Tigray, nas demais partes da Etiópia e no exterior.

As necessidades das pessoas detidas em relação com o conflito na região de Tigray não devem ser esquecidas, incluindo o seu direito de entrar em contato com os familiares e receber notícias deles.

No entanto, ainda não se sabe muito sobre o nível de violência e do consequente sofrimento que as pessoas na região de Tigray enfrentaram nas últimas três semanas. Os telefones e a internet continuam sem funcionar, o que dificulta nossa capacidade de verificar os relatos de forma independente.

Hoje todas as atenções se voltam para Mekelle, capital de Tigray. Mais de 500 mil pessoas moram na cidade, e sabemos que alguns hospitais já estão com os suprimentos perigosamente baixos.