Acesso Mais Seguro tem foco na preservação da vida e na proteção das pessoas

Acesso Mais Seguro tem foco na preservação da vida e na proteção das pessoas

Relatório 24 março 2022
Balanço Humanitário 2021

Programa Acesso Mais Seguro para Serviços Públicos Essenciais expande sua atuação e agora apoia a manutenção e oferta de serviços essenciais de saúde, educação e assistência social em sete municípios brasileiros

Em 2021, comunidades vulneráveis à violência armada seguiram convivendo com a apreensão diária pela ameaça de paralisação do atendimento de serviços públicos essenciais, além da insegurança do alto risco do contágio pelo vírus da Covid-19. Atento a isso, o Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) trabalhou para alcançar e beneficiar ainda mais comunidades. Entre os destaques do ano do programa Acesso Mais Seguro para Serviços Públicos Essenciais (AMS), estão a criação de um curso de capacitação on-line e a chegada da metodologia a São Paulo, bem como a continuidade das formações e o trabalho junto aos parceiros para sua legitimação como política pública.

Ao longo do ano passado, entre pessoas treinadas diretamente pelo CICV e as que receberam treinamentos de parceiros, 1.079 profissionais receberam treinamento em AMS para fazerem uma boa gestão de riscos em áreas vulneráveis à violência armada. Como? Por meio da identificação, análise, avaliação de riscos e adoção de medidas que busquem limitar os impactos dessa situação. As capacitações ocorreram nos sete municípios brasileiros nos quais o Acesso Mais Seguro está presente: Fortaleza (CE); Vila Velha (ES); Duque de Caxias (RJ); Rio de Janeiro (RJ); São Paulo (SP); Porto Alegre (RS), e Florianópolis (SC). Foram 923 profissionais treinados em AMS e 156, em Comportamentos Mais Seguros.

Além das capacitações com profissionais, foram realizados treinamentos em 152 unidades públicas de Saúde, Educação e Assistência Social dos municípios de Vila Velha (ES), Fortaleza (CE) e Porto Alegre (RS). Juntas, essas unidades beneficiam diretamente 42.477 pessoas.

"É uma transferência de conhecimento metodológico e capacidades. Essa metodologia [Acesso Mais Seguro] é uma adaptação dos protocolos de segurança desenvolvidos pelo CICV para os profissionais e voluntários da Cruz Vermelha que atuam em situações de conflitos armados. Esses cuidados são adaptados à realidade das comunidades atendidas e o resultado são instituições mais preparadas para enfrentarem uma situação de crise", explica Karen Cerqueira, coordenadora do programa Acesso Mais Seguro para Serviços Públicos Essenciais do CICV.


Capacitação da metodologia AMS em São Paulo. Foto: Tiago Queiroz/CICV

Resultados

No primeiro semestre de 2021, a apropriação e utilização da metodologia Acesso Mais Seguro ajudou a reduzir em 26% as horas de fechamento das unidades de saúde de Duque de Caxias (RJ) e Fortaleza (CE), quando comparamos com o mesmo período do ano anterior. Na prática, esse percentual representa um aumento da oferta desse importante serviço público a milhares de pessoas que não teriam outra opção de atendimento perto de suas casas.

"Se uma unidade de saúde ficar fechada o dia inteiro, o impacto para a comunidade que ela atende será muito grande. Por isso, é importante que os profissionais consigam mensurar o risco real a que estão expostos, além de adotarem medidas adequadas de prevenção àquele risco. O objetivo do programa é não expor os profissionais e usuários de serviços essenciais à população, mas também não limitar o acesso à atividade", explica Karen.

Como 2021 foi mais um ano de adaptação às novas realidades impostas pela pandemia da Covid-19, para dar continuidade aos treinamentos, o CICV desenvolveu uma plataforma de Ensino a Distância (EaD) que está sendo disponibilizada em 2022, aos parceiros. O curso tem duração de oito horas e a expectativa é que ajude a aumentar ainda mais o número de profissionais treinados em Comportamentos Mais Seguros, que, por sua vez, poderão se tornar multiplicadores desse conhecimento.

42.477 pessoas beneficiadas

Efeitos da Pandemia

Em 2021, as unidades de serviços essenciais seguiram se adaptando frente aos desafios impostos pela pandemia. No caso das instituições de saúde, as unidades estiveram envolvidas com as campanhas de vacinação. Já a área da educação precisou se ajustar ao retorno das aulas presenciais ou, muitas vezes, híbridas. Todos esses aspectos repercutiram no volume de trabalho dessas instituições, o que também trouxe impacto à saúde mental dos profissionais de ambos os casos.

Na área de saúde, fatores como o medo da contaminação, o aumento do número de mortes e o afastamento de familiares aumentou muito o estresse das equipes. Na educação, a tensão era provocada pela necessidade de se adaptar a um novo sistema de ensino, a distância, mesmo sem o conhecimento suficiente ou o domínio das novas tecnologias.

Nesse cenário de elevado número de vítimas (mais de 600 mil no Brasil), cansaço e estresse da população, o CICV lançou a segunda fase da campanha Valorize o Essencial, de apoio e valorização dos profissionais da saúde, educação e assistência social, que, além de trabalhar em condições adversas, muitas vezes sofrem agressões. Ao longo de 3 meses, eles receberam mensagens de acolhimento, encorajamento e dicas de autocuidado e adaptação para o convívio com a pandemia. A campanha também buscou destacar o aspecto humano e as histórias de quem estava na linha de frente do combate ao novo coronavírus. Vídeos e fotos foram compartilhados nas redes sociais, chamando atenção para a importância de respeitar as equipes. Para completar, foram realizados webinários específicos sobre o tema.

Além disso, atentos às necessidades dos profissionais que atuam prestando serviços essenciais à população em meio à pandemia da Covid-19, o CICV e a Cruz Vermelha Brasileira (CVB) fizeram duas rodadas de doações de materiais de higiene e proteção, e caixas térmicas para o estoque de vacinas a cinco municípios brasileiros parceiros do CICV na implementação do AMS: Duque de Caxias (RJ); Florianópolis (SC); Fortaleza (CE); Porto Alegre (RS), e Vila Velha (ES). O volume doado ultrapassa 383 mil itens — máscaras triplas descartáveis (83.500 unidades), luvas cirúrgicas (112.800 unidades) e 12.300 litros de álcool em gel 70%, entre outros materiais. 

Melhorias

Em 2021, o CICV também trabalhou na promoção para o engajamento e uso da Plataforma Digital AMS por parte dos parceiros. O aplicativo de mensuração e informação é vinculado ao sistema de notificação que identifica os sinais de risco do território, feito pelos profissionais que conhecem essa dinâmica e estão no local. Dessa maneira, as informações podem ser coletadas em tempo real, por pessoas que conhecem a dinâmica da região.
Conforme os riscos são identificados, sugerem-se medidas para a mitigação de problemas, que podem incluir o fechamento total ou parcial da unidade, o cancelamento de atividades externas ou internas e até mesmo a evacuação do terreno.

A notificação do aplicativo chega à gestão, que tem possibilidade de fazer esse acompanhamento e dar suporte no momento da situação de crise. As informações registradas ao longo do tempo facilitam uma atuação mais estratégica dos gestores, com o objetivo de prevenir e mitigar as consequências à oferta e o acesso aos serviços ocasionadas pela exposição à violência armada. Justamente por isso, a Plataforma Digital AMS foi vista pelos parceiros como um elemento de apoio à comunicação da unidade, facilitando o acompanhamento dos casos de violência armada por parte da própria gestão. Vale destacar: 2.027 usuários estiveram ativos ao longo do ano de 2021 — um aumento de 34%, em comparação ao ano de 2020. A plataforma contou com 130.540 acessos no último exercício, um aumento de 69% em relação ao ano anterior.

"Percebemos um engajamento dos parceiros que se mantiveram constantes na implementação do Acesso Mais Seguro. Foi um ganho muito importante, devido a esse cenário de desafios em que eles identificaram a importância da metodologia e se engajaram ainda mais", avalia Karen.

Os profissionais sentiram-se mais apoiados, não só pelo CICV, mas também pela gestão de suas instituições, sobretudo no que diz respeito ao respaldo na tomada de decisões, além da redução do impacto emocional e do fortalecimento da autoestima destes profissionais.

130.540 acessos
À plataforma Acesso Mais Seguro, que realiza o mapeamento de situações de risco, ao longo do ano. Alta de 69%, em relação a 2020.
2.027 usuários ativos
No sistema ao longo do último exercício, o que representa um acréscimo de 34%, em comparação ao ano anterior.

Fortalecimento

Em 2021, o AMS ganhou ainda mais força e presença. A metodologia chegou a um sétimo município: São Paulo, em uma parceria com a Coordenadoria Regional Sul de Saúde. A primeira capacitação para treinadores na capital paulista foi realizada em agosto, com a presença de cerca de 20 representantes de instituições de serviços essenciais diversos.

Outra conquista importante foi o fortalecimento da parceria do CICV com a Frente Nacional dos Prefeitos (FNP). Entre os esforços, ganhou destaque um encontro virtual com representantes de diversos municípios do país para discutir as contribuições do AMS para mitigar os impactos da violência armada em tempos de pandemia, no âmbito dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). O tema, inclusive, é um dos objetivos do AMS, que trabalha também para apoiar as instituições parceiras a atingir os ODS e a Agenda Global 2030, com foco nos objetivos 3, 4, 8, 16 e 17.

No fim do ano, o Encontro Anual da Rede AMS reuniu 171 integrantes em dois dias de eventos que contaram com a participação de 19 autoridades parceiras. Os participantes tiveram a oportunidade de compartilhar experiências, e de apresentar propostas de caminhos e estratégias para a sustentabilidade do programa AMS nas instituições.

152 Instituições receberam treinamentos
Em Vila Velha (ES), Foz do Iguaçu (PR) e Porto Alegre (RS), 923 profissionais foram capacitados em Acesso Mais Seguro e 156 em Comportamento Mais Seguro.

Depoimentos

Joana Nogueira, coordenadora executiva da Assessoria de Assuntos Institucionais da Prefeitura Municipal de Fortaleza

"O Acesso Mais Seguro tem se mostrado especialmente importante para os servidores das unidades de Saúde, Educação e Assistência Social de Fortaleza, porque vivemos uma crise de segurança na cidade, com disputas de territórios por facções. Temos relatos de moradores que não conseguem ir ao Posto de Saúde da sua região porque, para isso, teriam de cruzar um território dominado por uma facção inimiga da facção de onde eles moram.

Desde a implantação do Acesso Mais Seguro, conseguimos algumas melhorias no atendimento à população dessas regiões. Eu destaco três ganhos principais:

1. Maior sensação de segurança.

O servidor que trabalha nas áreas vulneráveis à violência, que passa pelas capacitações do Acesso Mais Seguro e tem acesso ao sistema de notificação, sente ter apoio para exercer suas atividades com segurança. Ele sabe que, se acontecer alguma coisa, será avisado ou terá uma retaguarda para evacuar o local. Ele sabe que existe um plano de contingência para cada situação de violência, capaz de garantir a proteção dele e de todas as outras pessoas que estiverem naquele local.

2. Melhora da capacidade de decisão da equipe responsável pela gestão das unidades de atendimento ao público.

A plataforma do Acesso Mais Seguro nos dá essa visão. Hoje, a gente consegue mensurar a questão do impacto da violência na oferta de serviços públicos. Vou citar um exemplo simples: se o segurança de uma unidade localizada em um bairro vulnerável à violência não pode trabalhar, a ausência dele impacta fortemente a oferta daquele serviço — muito mais do que a ausência de um segurança de um bairro de classe média alta, onde a interferência da violência é menor. Então, podemos remanejar profissionais de uma unidade para a outra.

3. Melhora da comunicação entre as unidades de atendimento ao público localizadas em regiões vulneráveis à violência.

Se um evento acontece em uma escola, o pessoal da unidade de saúde que fica na mesma região é avisado. Então, tem uma comunicação mais fluida entre os servidores de diferentes secretarias, mas que estão em unidades de atendimento em um território em comum. Recentemente, por exemplo, houve um tiroteio em frente a um posto de saúde e os servidores foram orientados, antes de chegar lá, a não ir trabalhar. Esse tipo de informação chega antecipadamente para eles, e eles se sentem mais seguros.

O Acesso Mais Seguro trouxe tantos ganhos para o nosso município e para os nossos cidadãos que, em 2021, trabalhamos em uma minuta de decreto municipal para regulamentá-lo como política pública. Esse texto foi escrito a muitas mãos, pelas pessoas que vivem o AMS na prática, e agora está passando por ajustes jurídicos para ganhar força de lei. Está tudo encaminhado para que, ainda neste semestre, tenhamos essa legislação aprovada."


Renata Costa de Oliveira, Ponto Focal da Equipe de Educação Preventiva na Gerência de Proteção Escolar da Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro

O Acesso Mais Seguro é muito importante aqui no Rio, onde temos muitas unidades escolares localizadas em comunidades que sofrem as consequências da violência armada. A metodologia nos ajuda a identificar os sinais do território, a avaliar as condições sobre o funcionamento do equipamento, a sistematizar boas práticas de autoproteção para nos manter seguros, a identificar situações de ameaça ao atendimento e a preservar a integridade da comunidade escolar. Quem passa pela capacitação consegue perceber melhor os sinais de que podem acontecer confrontos na região. Eles desenvolvem o hábito de compartilhar e monitorar esses sinais de alerta também por meio da plataforma do AMS e a para prevenir problemas. É uma conscientização diária, de fazer um exercício de avaliar quando é possível ou não manter o atendimento presencial e pleno à comunidade, porque existem outras estratégias, como operar em horário reduzido, por exemplo. A metodologia ajuda a fazer essa avaliação criteriosa para não prejudicar nem a comunidade, nem a integridade física e mental dos colaboradores.

Por tudo isso, a parceria com o CICV é fundamental para a prefeitura do Rio. Tanto que fizemos, em 2021, o projeto piloto de uma plataforma EaD para realizar capacitações de Comportamentos Mais Seguros. Nosso objetivo é ofertar esse curso para todas as unidades escolares da capital carioca — principalmente, para aquelas que não estão localizadas em áreas de confronto armado. Para as localizadas em áreas que sofrem episódios de confronto armado, temos o programa Acesso Mais Seguro. Hoje, o Acesso Mais Seguro está implantado em 504 unidades escolares do município. Nosso objetivo é levar esses conhecimentos a todas as 1.543 unidades escolares da Secretaria Municipal de Educação. Incluiremos também as unidades de extensão, como núcleos de arte e bibliotecas municipais. Já temos uma média de 165 turmas organizadas envolvendo 33 mil servidores, que serão beneficiados com a metodologia. A previsão de início é março deste ano.

É importante dizer que planejamos essa expansão audaciosa justamente por entendermos que o AMS é útil, importante e necessário para todos. Independentemente de estarmos em uma comunidade ou não, é importante saber como se prevenir de certas situações de violência às quais todos nós estamos sujeitos."