Demora anos, às vezes décadas, para que sociedades destruídas por conflitos armados se recuperem.
As pessoas da Síria sabem que guerras começam facilmente e só terminam depois de esforços persistentes e prolongados em prol da paz e da reconciliação, com uma grande dose de sofrimento pelo caminho. A destruição generalizada provocada pela guerra urbana e a dor de familiares de pessoas desaparecidas ou de famílias que foram separadas são desafios comuns em todos os conflitos do mundo.
A população civil paga o preço mais alto quando as guerras são travadas violando o Direito Internacional Humanitário (DIH). E também há pessoas deslocadas, pessoas levadas para campos ou abrigos provisórios, que acabam vivendo em condições terrivelmente duras por anos ou mesmo décadas com pouca ou nenhuma esperança.
Al-Hol, uma das crises de proteção mais difíceis da atualidade, ainda abriga mais de 56 mil pessoas, e dois terços delas são crianças. Nesta semana, em minha terceira viagem a este campo, vi com pesar que as condições estão piorando. As crianças têm menos comida, água potável, assistência à saúde e educação do que o exigido pelas normas internacionais. Elas estão continuamente expostas a perigos, e seus direitos são ignorados. A falta de atenção não é uma desculpa para esquecer as mulheres e crianças neste lugar.
Valorizamos os esforços feitos para repatriar as mulheres e crianças para seus países de origem. Mas este campo continua sendo uma vergonha para a comunidade internacional.
Ninguém deveria ser forçado a ficar apátrida. É preciso encontrar vontade política e soluções sustentáveis antes que mais vidas se percam.
Na Síria, a queda econômica provocada pelas consequências da crise e das sanções reduz drasticamente a capacidade da população de atender a suas necessidades vitais e de ter acesso a serviços básicos. As necessidades humanitárias no país continuam enormes; 90% da população vive abaixo da linha da pobreza e, dos 18 milhões de habitantes, cerca de 14,6 milhões continuam precisando de ajuda humanitária. A ampla destruição e a deterioração gradual de infraestruturas vitais – água, eletricidade e assistência à saúde – sobrecarregam a capacidade de resposta da população.
Onze anos de crise e os estragos causados pela Covid-19, agora somados à crise da Ucrânia, têm sérias repercussões para esta economia conturbada: as importações de alimentos e combustíveis foram interrompidas e a libra síria despencou vertiginosamente.
Depois de uma década de visitas à Síria como presidente do CICV, sinto muito carinho pelo povo deste país. Este tem sido um dos contextos decisivos de minha presidência e das operações humanitárias em todo o mundo.
Fiquei comovido com o sofrimento das pessoas neste conflito e impressionado com sua resiliência quando, nos escombros de suas casas, ouvia seus apelos para encontrar seus familiares desaparecidos. Embora este conflito prolongado tenha entrado numa nova fase, é evidente que o apoio da comunidade internacional é necessário para ajudar esta população em queda livre.
Para mim, está claro que quanto mais as normas e os princípios humanitários forem respeitados durante um conflito, maior será a chance de reconciliação e, também, de que o sofrimento seja menor. Devemos seguir o impulso humanitário de ajudar as pessoas que não têm comida, água nem abrigo, as pessoas sem acesso a cuidados de saúde, aquelas cujos familiares estão separados ou desaparecidos e aquelas que estão em detenção.
As necessidades a longo prazo do povo da Síria são imensas. Uma solução política é crucial para acabar com o sofrimento de milhões de pessoas. A população civil continua pagando o preço da falta de um avanço político, mas também de abordagens transacionais à ação humanitária por todas as partes envolvidas.
Minha visita ocorre num momento em que a tragédia visita outras partes do mundo. Ao falar do trabalho do CICV para evacuar pessoas civis de Aleppo no final de 2016 ou, mais recentemente, de Mariupol, na Ucrânia, fico orgulhoso de que o CICV tenha conseguido fornecer ajuda e proteção a quem mais precisa, trabalhando para realizar uma ação humanitária neutra e imparcial.
Mais informações:
Adnan Hezam, CICV Damasco, Tel.: +97 733 721 659 or ahizam@icrc.org
Imene Trabelsi, CICV Beirute, Tel.: +33 662 28 19 56 or itrabelsi@icrc.org