Somália: falta de chuvas ameaça o modo de vida nômade

29 novembro 2017
Somália: falta de chuvas ameaça o modo de vida nômade
Abdullahi Abdrahman perdeu 450 cabras, camelos e ovelhas desde o início da seca. CC BY-NC-ND / CICV / Anisa Hussein

As palavras rob raac em somali significam seguidor de chuva. É um termo normalmente utilizado nos círculos pastoris que se refere à vida nômade de mudar com o rebanho de um lugar a outro em busca de pastagens e água. Este estilo de vida é compartilhado por muitos pastores, que constituem 60% da população da Somália.

Contudo, a escassez de chuva por períodos consecutivos no país prolongou a seca desoladora, interrompendo o modo de vida de muitos nômades que andam pelas terras.

"Seguimos as chuvas a todos os cantos do país", afirma Abdullahi Abdirahman, pastor que vive agora em um abrigo temporário no povoado de Hirsi Hade, na região Galmuduug na Somália. Os sapatos empoeirados estão gastos pelos anos de caminhadas através de terras áridas com os seus 500 animais – cabras, camelos e ovelhas.

A seca causou uma interrupção no estilo de vida desse homem de 70 anos.

"Caminhei mais de 200 km nos últimos meses em busca de chuva, comida e pasto para a minha família e o que sobrou das cabras, ovelhas e camelos", conta Abdullahi. "Sobraram agora 50 animais muito fracos que não podem produzir leite ou carne."

Muitos como ele fizeram essa longa viagem, mas terminam sem recompensa pelos seus esforços.

"As pessoas que originalmente tinham 30 cabras agora só têm uns 30, todas muito fracas", ele acrescenta. "Muitos animais morreram no caminho por fome ou doenças antes de chegar às pastagens."

Os pastores estão há muito acostumados com as duras condições da Somália, mas a seca prolongada levou muitas famílias à beira da morte por fome.

Farhiyo Mohamed prepara uma refeição para os filhos. Devido à escassez de chuvas, ela agora vive em um campo nos arredores da cidade de Guriel. CC BY-NC-ND / CICV / Anisa Hussein

Carcaças de animais torradas pelo sol estão espalhadas pela área, restos do que alguma vez foram bens de alto valor que davam carne, leite e renda para as famílias. Os animais também são moeda de troca para dotes ou resolução de disputas. Isso faz com que os esqueletos sejam uma visão triste, mas não incomum na região.

Abatidos pelas perdas e poucos ganhos pelos seus esforços, muitos pastores, incluindo Abdullahi, terminam se assentando em abrigos temporários em cidades desconhecidas sem nada para viver, exceto a ajuda humanitária.

Problemas em dobro: seca e conflito

Infelizmente para essas comunidades pastoris, as longas temporadas de seca não são o seu único problema.

"Durante a nossa estadia na região de Hiran, houve conflitos entre clãs por causa de disputa pelas terras de pastagens", afirma Farhiyo Mohamed, de 35 anos, também uma pastora que vive em um campo de deslocados na periferia da cidade de Gurial, a 10 km da área de Abdullahi. Ela ficou no campo com os seus nove filhos enquanto que o marido partiu ao norte da Somália com os animais em uma tentativa de manter alguns deles vivos.

"Temos que encontrar uma maneira de nos ajudar e compartilhar a comida que temos", diz Farhiyo, com esperança. "Se eu cozinhar alguma comida, temos que dividir, assim é como sobrevivemos".

Ajuda

Em novembro, as famílias de Abdullahi e Farhiyo formavam parte das 15 mil que receberam sacos de arroz, óleo de cozinha, feijão e aveia para mingau que o Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) distribuiu na Região de Galgaduud. Espera-se que a comida alimente as famílias até o final do ano. As famílias deslocadas receberam produtos adicionais como colchonetes, utensílios de cozinha, lonas e kits de higiene.

As mulheres descansam nos sacos de mantimentos em uma recente distribuição de comida do CICV. Em novembro, 15 mil famílias da região de Galgaduud receberam sacos de arroz, óleo de cozinha, feijão e aveia para mingau. CC BY-NC-ND / CICV / Anisa Hussein

O CICV também realizou uma grande campanha de tratamento veterinário para mais de um milhão de animais em novembro para ajudar a incrementar os esforços de recuperação dos pastores.

Apesar da persistência da seca, algumas chuvas leves foram observadas em algumas regiões da Somália desde outubro, sinalizando o início da estação de chuvas de fim de ano (chamada de deyr).

Abdullahi desistiu completamente da vida nômade, mas Farhiyo espera deixar o campo desde a volta do seu marido. Se a chuva for firme, eles partirão para rob raac onde for que a chuva os leve.