Brasil: CICV promove oficina sobre acolhimento a familiares de pessoas desaparecidas para IML de São Paulo
Como uma pessoa que procura por um familiar desaparecido no Instituto Médico Legal (IML) deve ser recebida e tratada? Que tipo de orientações e ajuda do Poder Público deve receber?
Para contribuir para a construção de respostas adequadas a essas perguntas, o Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) e o IML de São Paulo realizaram, no dia 30 de julho, a 2ª oficina “Acolhimento e Apoio Psicossocial Básico para Familiares de Pessoas Desaparecidas em momentos específicos de busca” no Espaço Cultural Casa do Lago, na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
O treinamento foi dirigido a 25 servidores do IML-SP que trabalham no atendimento direto aos familiares em busca de informações sobre entes queridos desaparecidos e/ou familiares de pessoas falecidas identificadas e não-reclamadas na região de Campinas e em cidades próximas. Uma resposta mais humanizada por parte destes funcionários pode atenuar sentimentos de angústia, ansiedade e estresse, bem como evitar outros impactos negativos durante essa busca.
Servidores que trabalham na região de Campinas e em cidades próximas foram treinados.
O encontro abordou as várias necessidades vividas por estes familiares: saber o que aconteceu, receber tratamento digno e igualitário, assim como suprir suas necessidades jurídicas, administrativas, econômicas e de saúde.
A responsável pelo programa de Saúde Mental e Apoio Psicossocial da Delegação Regional do CICV para Argentina, Brasil, Chile, Paraguai e Uruguai, Renata Reali, destacou que um atendimento com enfoque diferenciado começa com o exercício de se colocar no lugar do outro. “É fundamental tratar as pessoas que buscam familiares desaparecidos com respeito e dignidade, reconhecendo sua dor e orientando em relação aos seus direitos. Ter clareza na comunicação e uma escuta atenta, sem julgamentos ou preconceitos, bem como oferecer respostas com empatia podem ajudar durante o processo de busca”, afirmou Reali.
Para o coordenador forense da Delegação Regional do CICV, Frederico Mamede, existe também um componente técnico em uma acolhida adequada de um familiar de pessoa falecida ou de pessoa desaparecida. “São as famílias que têm as informações que levarão à identificação da pessoa falecida e para isso elas precisam entender o processo forense. Esse entendimento passará por um bom acolhimento e uma boa comunicação”, explicou.
A oficina, que incluiu simulações e exercícios práticos, representou uma oportunidade para que os servidores do IML-SP compartilhassem relatos dos desafios envolvidos no acolhimento a esse público. A necessidade de os funcionários estarem atentos ao autocuidado, sobretudo em relação à sua saúde mental, também foi abordado. Afinal, como destacou Reali, “para acolher e tratar com respeito e humanidade é preciso estar bem.”
Um atendimento diferenciado começa com o exercício de se colocar no lugar do outro.
O diretor do IML-SP, Vladimir Alves dos Reis, enfatizou a importância desta parceria com o CICV. “Isso é muito importante porque, em geral, quando se fala em medicina legal em algum curso ou treinamento, a primeira coisa que vem à mente dos participantes é o morto. Mas nós atendemos muito mais pessoas vivas. Por isso, a nossa ideia é difundir que medicina legal é ciência para o vivo. A família quer uma resposta, quer saber o que aconteceu e o ser humano tem direito ao luto pelo ente querido quando o desfecho é o falecimento”, afirmou Reis.
Os participantes da oficina destacaram a oportunidade de refletir sobre o próprio trabalho. Para Diogo Duarte, atendente de necrotério policial no Núcleo de Perícias Médico-Legais de Americana, treinamentos como este “mostram como orientar da melhor forma possível”. Já Edison de Souza, que atua no IML desde 1988, disse que a oficina “esclareceu várias dúvidas sobre como abordar pessoas nesse momento de tanta vulnerabilidade”. Maria Lígia Pasetto, auxiliar de necropsia em Campinas, acredita que é útil compartilhar experiências com colegas de outras unidades. “As famílias que buscam pessoas desaparecidas no IML precisam de carinho e atenção nesse momento tão triste”.
A atuação do CICV na temática do desaparecimento tem três enfoques: apoio para a compreensão deste fenômeno, através da publicação de documentos técnicos e da realização de cursos; colaboração com as autoridades na construção de mecanismos de busca capazes de responder ao problema e serviços de atenção aos familiares nas suas múltiplas necessidades; e, por fim, fortalecimento das organizações de familiares para que possam participar ativamente da elaboração de políticas públicas e se apoiar mutuamente.
A elaboração de respostas ao desaparecimento exige o engajamento de variados atores estatais e da sociedade civil. Por isso, o CICV oferece apoio técnico a autoridades nacionais e locais, principalmente em São Paulo, Rio de Janeiro e Fortaleza, através da participação em grupos de trabalho, a promoção de sessões de capacitação e intercâmbio de experiências, a apresentação de recomendações técnicas e o acompanhamento de ações realizadas por órgãos públicos e algumas organizações da sociedade civil.