Princípios Fundamentais: 60 anos de humanidade em ação
Em épocas de guerra, desastre ou deslocamento, o que as pessoas afetadas pela crise mais precisam é poder contar com uma ajuda confiável. É aí que entram o Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) e os parceiros do Movimento Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho. Durante mais de 160 anos, trabalhamos em linhas de frente e em comunidades destruídas pela violência – prestando assistência médica, reunindo famílias, visitando pessoas detidas, restaurando sistemas de abastecimento de água e lembrando todas as partes de que a população civil deve ser protegida sempre.
Além de nossa presença e experiência, o que torna este trabalho possível são os Princípios Fundamentais que orientam nossa ação humanitária. Adotados em 1965 como uma expressão formal do modo como sempre trabalhamos, esses sete princípios – humanidade, imparcialidade, neutralidade, independência, serviço voluntário, unidade e universalidade – continuam sendo a base de nossa ação humanitária.
Eles não são ideais abstratos: são as ferramentas que nos permitem ajudar quem mais precisa.
A importância dos Princípios
Os Princípios Fundamentais são uma bússola para a ação humanitária. Eles orientam nossas decisões em alguns dos contextos mais perigosos e polarizados, a fim de garantir que as pessoas recebam ajuda com base apenas em suas necessidades, não em quem são, de onde vêm ou de que lado estão em um conflito.
Por causa dos Princípios Fundamentais, o Movimento Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho pode:
- Negociar o acesso para cruzar linhas de frente e levar alimentos, água, assistência médica e refúgio aonde outros não conseguem chegar.
- Realizar com segurança evacuações e transferências médicas para tirar do perigo pessoas civis e combatentes feridos.
- Reunir famílias que foram separadas por situações de conflito armado, desastre ou migração.
- Garantir a repatriação digna de pessoas falecidas para dar respostas a famílias enlutadas.
- Dar apoio aos serviços básicos, como saúde, sistemas de abastecimento de água e resposta a epidemias em contextos frágeis.
Esses resultados só são possíveis porque os princípios possibilitam a confiança e o diálogo – com as comunidades, com as autoridades e com todos os lados de um conflito.
Princípios em ação
Todos os dias, os princípios se traduzem em ações que salvam vidas:
- Em Gaza, mais de 80 mil consultas, 3 mil cirurgias e 4 mil partos foram realizados no hospital de campanha apoiado pelo CICV em Rafah em seu primeiro ano, que prestou atendimento urgente apesar dos combates.
- No conflito armado internacional entre Ucrânia e Rússia, o CICV ajudou mais de 14,8 mil famílias a saber o que aconteceu com entes queridos desaparecidos e transmitiu mais de 20,9 mil mensagens pessoais entre prisioneiros de guerra e seus familiares.
- No Iêmen, o CICV facilitou a libertação e o retorno seguro de mais de mil pessoas detidas desde 2020, reunindo famílias que passaram anos separadas.
- Na República Democrática do Congo, mais de 1,3 mil soldados desarmados e seus familiares foram transferidos cruzando linhas de frente para voltar para casa em segurança.
- No Afeganistão, os centros de reabilitação fornecem próteses e fisioterapia a dezenas de milhares de pessoas que foram feridas na guerra, para que possam voltar a andar e recuperar a independência.
- Depois de desastres como as inundações no Paquistão e a explosão no porto de Beirute, voluntários da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho responderam de modo imparcial para fornecer abrigo, assistência médica e ajuda de emergência.
Essas histórias revelam o que os princípios tornam possível: colocar em prática a humanidade.
Princípios sob pressão
No entanto, hoje, a ação humanitária baseada em princípios está ameaçada.
- Os ataques a profissionais humanitários atingiram níveis recordes. O ano de 2024 foi o mais letal já registrado para o setor humanitário, e 2025 vai pelo mesmo caminho.
- A politização da ajuda prejudica a imparcialidade, pois a assistência fica cada vez mais vinculada a interesses políticos.
- As campanhas de desinformação abalam a confiança e comprometem o acesso seguro às comunidades necessitadas.
- O discurso desumanizador priva pessoas civis de proteção, enquanto a militarização da ajuda confunde soldados e profissionais humanitários.
As tecnologias que estão surgindo também trazem novos dilemas: embora tenham agilizado a ajuda, as ferramentas digitais podem abalar a empatia, criar dependências e amplificar percepções preconceituosas. Aqui, também, os Princípios continuam sendo nossa bússola, para garantir que a humanidade, a neutralidade, a imparcialidade e a independência nos guiem na era digital.
Um apelo ao respeito pelo espaço humanitário
Os princípios criam espaço para a ação, mas apenas se forem respeitados. Pedimos que os Estados e todos os atores se comprometam a:
- Proteger o espaço humanitário neutro, imparcial e independente;
- Garantir que as sanções e medidas de combate ao terrorismo não impeçam a ajuda;
- Proteger a independência das Sociedades Nacionais;
- Evitar impor restrições políticas ou condições ao financiamento humanitário; e
- Combater a desinformação e os ataques a profissionais humanitários.
60 anos e muitos mais
Neste aniversário, não se trata apenas de olhar para trás. É preciso reafirmar que os princípios continuam tão vitais hoje como eram em 1965 e que continuarão sendo essenciais para os desafios do futuro.
De Mônaco e Viena a Bruxelas, as comemorações estão ocorrendo em todo o Movimento. Em conjunto, destacam que os princípios não são apenas parte da nossa história: eles são nosso futuro. Graças a eles, podemos ajudar pessoas nos momentos mais difíceis para restabelecer a dignidade, a esperança e a humanidade.
Durante 60 anos, os princípios fundamentais abriram portas que estavam fechadas, construíram confiança onde o receio imperava e prestaram assistência onde mais precisavam dela. Eles continuam sendo nossa base e uma tábua de salvação para milhões de pessoas a cada ano.