Brasília (CICV) – Quando as pessoas morrem durante uma situação de violência armada, desastres naturais, migrações, entre outros, os restos mortais devem ser identificados, e seus corpos precisam ser tratados com respeito e dignidade. A ação humanitária inclui essas tarefas e a ciência forense oferece as ferramentas e as competências necessárias para realizá-las. Entretanto, é preciso coordenação entre as autoridades que trabalham com o tema. Para promover um espaço de diálogo entre instituições forenses, o CICV realizou o I Encontro Nacional de IMLs – A Importância da Cooperação e Coordenação Interinstitucional em um País Federado, entre os dias 23 e 24 de junho, em Brasília.
O encontro reuniu cerca de 60 representantes de Institutos de Medicina Legal (IML) de todos os estados do Brasil, entre eles autoridades e profissionais responsáveis pela gestão, planejamento e tomada de decisão, que contribuem para a proteção de pessoas falecidas e seus familiares. A proposta do CICV foi unir forças para que haja um diálogo fluido e relações interinstitucionais fortalecidas entre os diversos IML do país, bem como dar visibilidade às ações que estão sendo desenvolvidas no contexto nacional, especialmente na gestão de pessoas falecidas.
"Sabemos que a ciência forense acrescenta muito para a ação humanitária. No CICV, trabalhamos de forma multidisciplinar, com outros programas. Também trabalhamos com várias outras instituições com essa temática. Um espaço como esse é extremamente importante para a coordenação e cooperação entre todos. Espero que seja o primeiro encontro e que sirva de inspiração para muitos outros nos próximos anos", afirmou o chefe da Delegação Regional do CICV para Argentina, Brasil, Chile, Paraguai e Uruguai, Alexandre Formisano, na inauguração do evento.
O Secretário Nacional de Segurança Pública, Carlos Paim, falouo sobre a importância de se criar uma rede Foto: A. César/ CICV
O Secretário Nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça e Segurança Pública, Carlos Paim, que participou da sessão de abertura, elogiou a iniciativa. "O maior ganho deste encontro é o envolvimento de todos os estados. Esse é o momento de criar uma rede para que possamos pensar em soluções de investimentos na pauta de IMLs. Eles precisam estar vinculados a um projeto contínuo e constante de investimentos", afirmou. "É preciso fazer "investimentos cirúrgicos para que possamos ter um ambiente de crescimento e, aí sim, avaliarmos a nossa política pública", complementou.
Ao longo dos dois dias, os especialistas na temática forense participaram atentamente das sessões, com um ativo e saudável debate. "Essa interação com outros Estados é de grande valia. É de primordial importânica a gente ter conhecimento do que acontece em outros Estados e até em outros países. Até para sabermos se nós estamos conduzindo de maneira correta o nosso trabalho", considerou a coordenadora da Odontologia Legal e Antropologia Forense do IML de Belém (PA), Maria Betânia Lisboa. "Daqui inclusive estão saindo algumas ideias para serem implantadas em nosso estado", complementou.
Fortalecimento
Entre os principais temas de trabalho do I Encontro Nacional de IMLs, a importância do fortalecimento de políticas públicas sobre a temática forense para promover respostas às famílias das pessoas desaparecidas ganhou destaque.
A gerente da Política Nacional de Busca de Pessoas Desaparecidas da Secretaria Nacional de Segurança Pública, do Ministério da Justiça e Segurança Pública, Helena Ferraz Monteiro, celebrou a oportunidade de poder refletir sobre a temática de pessoas desaparecidas no marco do encontro. Para Ferraz, o papel da Política Nacional de Busca de Pessoas Desaparecidas "que tem como objetivo solucionar e prevenir o desaparecimento de pessoas, só vai funcionar com a boa integração e comunicação de todas as instituições envolvidas, incluindo os IML e outros atores responsáveis pela gestão de pessoas falecidas".
"O Brasil é um país muito grande e diversificado. A gente sabe que alguns dos Estados avançam mais que outros. Nosso papel enquanto Governo Federal é criar mecanismos para interlocução e intercâmbio de informações, além de buscar avanços de forma mais unificada e célere para investigar os mecanismos de busca e evitar a desaparecimento", reforçou a gerente.
"Se os IMLs, que fazem a gestão de pessoas falecidas, não conseguem ter informação sobre as pessoas falecidas que estao sob suas custódia e se comunicar, essas pessoas falecidas podem se tornar pessoas desaparecidas para alguém. Por isso é preciso que eles se comuniquem, colaborem e se coordenem para seja mais fácil que essas pessoas possa ser identificadas", pontuou o assessor forense do CICV no Brasil, Frederico Mamede.
Mamede explicou que apesar do encontro ser uma iniciativa do CICV, já era uma demanda dos IML do Brasil. No seu rol de atribuições, o CICV tem como promover esse tipo de integração. "Então estamos aqui coordenando esse encontro para que eles possam se conhecer e, a partir dai, começar uma coordenação intersinstitucional".
Intercâmbio
Para aumentar a conscientização sobre a importância da coordenação interinstitucional e exemplos de boas práticas, representantes forenses do CICV no Uruguai, México e Colômbia estiveram presentes para explicar o assunto em seus contextos.
O diretor do Instituto de Serviços Periciais e Ciências Forenses do Poder Judicial da Cidade do México, Felipe Takajashi, compartilhou a experiência e os desafios enfretados pelo México no campo forense. "O impacto gerado quando se recebe um ser querido diminui quando entregamos a vítima de uma forma digna. É importante fazer essa entrega da melhor forma possível para as famílias". Para o médico, a criação e o reforço das unidades de identificação forense são indispensáveis, além de lugares dignos para o diálogo e entrevistas com pessoas e familiares que buscam respostas.
Takajashi ressaltou o tema de pessoas falecidas não identificadas e a importância do compartilhamento de informações para essa temática . "No México, tratamos de promover uma interação com as distintas instituições que tem relação com o desaparecimento de pessoas. Temos que enfrentar muitas circunstâncias, mas a ideia é seguir trabalhando para conseguir um sistema que possa contar com informações a nível nacional".
Após todas a sessões expositivas, ao final do evento, foi realizada uma grande reunião entre todos os representantes de IMLs presentes.
CICV e o trabalho forense
O Programa Forense da Delegação Regional do CICV para argentina, Brasil, Chile, Paraguai e Uruguai tem como foco principal a Proteção das Pessoas Falecidas e Seus Familiares, integrando o trabalho de resposta multidisciplinar na área da Proteção de Vínculos Familiares. Nos países em que está presente, o CICV trabalha junto as autoridades forenses fazendo recomendações técnicas e promovendo intercâmbios de boas práticas, para que essas autoridades possam responder de forma satisfatória e digna sobre a gestão das pessoas falecidas e atendimento a seus familiares.
Saiba mais no folheto A Ciência Forense e a Ação Humanitária no Brasil