Municípios brasileiros criam rede sobre implementação de Acesso Mais Seguro
"Doutor, o senhor não pode mais entrar aqui. Está muito difícil conviver aqui e vocês correm risco" – esse é um relato comum entre profissionais de saúde dos municípios brasileiros que se reuniram no II Encontro de Saúde e Violência no Rio de Janeiro entre 30 de novembro e 02 de dezembro.
O evento promoveu um debate sobre a implementação do Acesso Mais Seguro (AMS) adaptada aos serviços de Saúde e à formação de uma rede entre os municípios onde a metodologia AMS está sendo implantada, a fim de trocar experiências e encontrar soluções conjuntas aos desafios diante de situações de violência armada. Com o apoio do CICV, as boas práticas desenvolvidas serão transformadas em guias e documentos de referência.
"O desafio para os municípios era adaptar nossa metodologia às necessidades e aos desafios aos que se enfrentavam os serviços de saúde ao nível local. E pudemos ver que o uso do acesso mais seguro tem tido um impacto positivo na qualidade de vida desses profissionais, e consequentemente no aumento do acesso aos serviços pela população", avaliou o chefe adjunto da Delegação Regional do CICV em Brasília, José Antonio Delgado.
Essa tem sido a experiência em Porto Alegre, segundo o secretário de Saúde da cidade, Fernando Ritter: "Os protocolos de segurança dão mais tranquilidade aos profissionais de saúde e melhoram os serviços. Tivemos no passado mais de cinquenta episódios onde fechamos as unidades de saúde, que, com o acesso mais seguro, não teríamos fechado".
Experiências locais
O enfermeiro de Duque de Caxias Odimar Lisboa integrou a primeira equipe a ser treinada em sua cidade. "Por tudo a gente achava que tinha que fechar a unidade de saúde. Hoje, temos critérios pré-definidos que nos ajudam a decidir. Por exemplo, tivemos um tiroteio e roubo de carro em frente à nossa unidade. Fechamos naquela hora, mas continuamos trabalhando, terminando os atendimentos de quem já estava lá. E quando vimos que estava seguro, reabrimos", relata.
Para a enfermeira de Florianópolis Juliana Cipriano, as regras dão mais tranquilidade aos profissionais: "Antes tínhamos muito medo. Sabendo que pode acontecer, com prevenção, é mais tranquilo. Estamos atentos à situação a todo momento. E não só os médicos, mas o pessoal administrativo, da limpeza, o que facilita nossa análise da situação", afirma.
Mas a metodologia também ajuda a quem já não percebia os riscos. "Como vivo na comunidade, você se acostuma com a violência. Então eu era muito corajosa. Nunca queria parar, fechar a unidade. Depois do treinamento, eu me sinto mais segura para tomar outras decisões. Hoje eu me exponho muito menos, e também a minha equipe", conta a enfermeira Andreia Macedo de Duque de Caxias.
Participaram do encontro representantes das secretarias municipais de saúde do Rio de Janeiro, Duque de Caxias, Itaboraí, Florianópolis e Porto Alegre. Também estavam presentes profissionais do Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia Jamil Haddad (INTO), dos Programas de Atenção Domiciliar de Porto Alegre e Rio de Janeiro, da Fundação de Assistência Social e Cidadania de Porto Alegre (FASC) e da Secretaria de Governança de Porto Alegre.
Metodologia Acesso Mais Seguro
A metodologia AMS foi adaptada para os serviços de saúde e educação cariocas durante o Projeto Rio (de 2009 a 2013), realizado pelo CICV em comunidades afetadas pela violência armada do Rio de Janeiro. A pedido das autoridades locais, o programa Acesso Mais Seguro está sendo replicado em 12 cidades brasileiras desde 2015.
O AMS pode ajudar as instituições (como os serviços de saúde, educação e Assistência social) e aos seus profissionais a reduzir e mitigar os riscos que podem correr em contextos delicados e inseguros. O Marco de Acesso Mais Seguro propõe uma série de ações e medidas para estar preparado e responder aos desafios e prioridades específicos do contexto, a partir da avaliação permanente de risco e do estabelecimento de medidas e procedimentos que reduzam esses riscos em seu dia a dia.