Brasil: Mesmo na pandemia, foram registrados 62,8 mil desaparecimentos em 2020
O dado foi divulgado nesta quinta-feira (15) pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), uma semana após o CICV lançar relatório com recomendações sobre o fenômeno
Brasília (CICV) – Em um ano marcado pela pandemia de Covid-19, o Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) observa que a quantidade de registro de desparecimento de pessoas continua elevada no país. Segundo dados divulgados nesta quinta-feira (15) no Anuário Brasileiro de Segurança Pública, foram 62.857 registros no ano de 2020, acompanhados de um número de 31.996 de pessoas localizadas.
Os dois números tiveram uma redução de mais de 20% em relação a 2019. De todo o contexto observado no Brasil, o CICV avalia que o número anual de registros de desaparecimento ainda é elevado e o fenômeno continua precisando de atenção especial e coordenação entre as autoridades – em nível federal, estadual e municipal.
"Com base nos dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, temos observado que na última década o país tem reportado acima de 60 mil registros de desaparecimentos de pessoas. É uma questão humanitária complexa que não vitima apenas quem desapareceu, mas também suas famílias e a sociedade como um todo. Para as famílias, o impacto é devastador e cria múltiplas necessidades", observa a coordenadora de Proteção do CICV, Rita Palombo. "Para começar seu trabalho de acompanhamento a familiares de pessoas desaparecidas em São Paulo, o CICV realizou uma avaliação destas necessidades", completa.
O relatório "Ainda? Essa é a palavra que mais dói" foi lançado semana passada pelo CICV, dá voz aos familiares, e também que traz nossas recomendações às autoridades e à sociedade brasileiras.
Lançamento do Relatório: “Ainda? Essa é a palavra que mais dói from ICRC on Vimeo.
O desaparecimento de pessoas é um problema global amplo, heterogêneo e que poderá ser mais bem compreendido com o aprimoramento da coleta de dados e produção de estatísticas sobre este fenômeno. No Brasil, dados sobre os registros de desaparecimento passaram a integrar o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, do FBSP desde 2017, que fez levantamento e apresentou dados a partir de 2007. A média de registros passou de cerca de 72 mil por ano para 62,8 mil. Para a coordenadora do programa Pessoas Desaparecidas e suas Famílias do CICV, Larissa Leite, a queda dos dados relativos a 2020 ainda precisa ser mais bem compreendida.
"Além de o número total permanecer preocupante, não temos elementos muito detalhados sobre a diminuição do número de registros. Como se tratou de um ano de pandemia, precisamos buscar mais elementos para entender se houve realmente menos desaparecimentos ou mais dificuldade para registrar os casos, já que ir a delegacias ou ser atendido para registrar um boletim de ocorrência pode ter significado um desafio para muitas famílias, devido ao distanciamento social, à redução de serviços de transporte e à limitação atendimento ao público por vários serviços", explica a coordenadora. "Independentemente disso, observamos que há no país muitas autoridades com papel relevante a cumprir, e há também várias pontes a construir entre elas, entre as autoridades e a sociedade civil e entre as famílias e os serviços e grupos que podem apoiá-los."
Avaliação das necessidades dos familiares e recomendações
Para elaborar o relatório "Ainda? Essa é a palavra que mais dói", o CICV se concentrou no estado com maior números de casos, São Paulo, segundo dados dos Anuários de Segurança Pública.
O CICV acompanhou de maneira constante e próxima, com entrevistas coletivas e individuais, um grupo de 27 famílias de pessoas desaparecidas a fim de se aprofundar nesses casos e compreender suas necessidades. Também foram ouvidos 18 servidores públicos com experiência no atendimento a casos de desaparecimento e seis líderes e colaboradores de associações de familiares de pessoas desaparecidas.
Para o CICV, a realidade dos familiares de quem desaparece é o ponto fundamental para orientar as ações relacionadas ao desaparecimento. São eles que conhecem, na maioria dos casos, os fatos essenciais para a busca, os que sofrem as consequências da ausência e, logo, os que podem falar melhor sobre suas necessidades. Por isso, o CICV enfatiza a importância da participação dos familiares em todo o processo de busca por soluções e melhorias no sistema para enfrentar a problemática do desaparecimento.
A análise do Comitê Internacional da Cruz Vermelha é a de que a realidade é complexa, as portas de acesso que os familiares precisam bater por conta própria são muitas e ainda precisam ser melhor coordenadas. Suas necessidades ainda estão negligenciadas, mas as experiências já existentes em São Paulo felizmente apontam para bons caminhos, com base nos quais consideramos muito factível implementar as recomendações do relatório.
No relatório, o CICV faz recomendações a partir da necessidade e o direito de saber o paradeiro do ente querido desaparecido, cuidados com a saúde física e psicossocial, reconhecimento, tratamento igualitário e justiça, necessidades legais, administrativas e financeiras. A organização reconhece que no país já existe uma variedade de instituições e organizações que trabalham com o tema do desaparecimento.
Mais informações
Diogo Alcântara, CICV Brasília, (61) 98248-7600, dalcantara@icrc.org
Sandra Lefcovich, CICV Brasília, (61) 98175-1599, slefcovich@icrc.org