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Sudão: Gauthier Lefèvre, funcionário do CICV libertado, relata semanas em cativeiro

19-03-2010 Entrevista

Gauthier Lefèvre, chefe da subdelegação do CICV em Al Jeneina, foi finalmente libertado por seus sequestradores em 18 de março, depois de 147 dias em cativeiro, o mais longo mais de uma série sequestro de profissionais humanitários em Darfur.

  Veja também o comunicado de imprensa, 18.03.2010

   
©CICV / N. Aguirre Zimerman 
   
Gauthier, no dia seguinte a sua liberação, no jardim da delegação do CICV em Cartum. 
       
©CICV / D. El Doueihy 
   
Gauthier, horas depois de sua liberação, no avião de Al Jeneina a Cartum, cercado pelos colegas do CICV. 
       
©CICV / T. Gassmann / V-P-CH-E-00632 
   
23.03.10. Ao chegar á sede do CICV em genebra, Gauthier Lefèvre é recebido pelo presidente da organização, Jakob Kellenberger. 
       

  O senhor foi sequestrado apenas cinco dias antes de terminar sua missão no Sudão. Como o senhor se sentiu?  

Na verdade, aceitei rapidamente a situação e parei de pensar nisso depois de alguns dias. Esquecer isso era um mecanismo de proteção. Era minha maneira de tentar não me sentir deprimido todos os dias. Isso me ajudou a manter o equilíbrio durante o sequestro e a me concentrar no futuro.

  Como foi isso?  

Eu tinha de me concentrar no dia da minha liberação. Eu estava em um lugar onde tudo o que via era vazio... o céu, as planícies, as colinas. Sabia que meus colegas do CICV não se esqueceriam de mim e que estavam trabalhando duro para conseguir me libertar. Pensava no amor da minha família e na maravilhosa mulher que contava com meu retorno, que esperava minha libertação.

  Ainda assim, 147 dias é um período muito longo para estar sozinho em um lugar.  

Eu tinha um pedaço de papel-cartão, no qual escrevia frases que me ajudaram. Uma delas era que o mais importante para mim era chegar ao final do dia. Pensava positivo: todos os dias que passava aí era um dia a menos do meu cativeiro e um dia mais próximo da minha liberação. Além disso, as noites eram muito melhores do que os dias. Havia o silêncio, paz, e não havia moscas. Os dias eram muito quentes e exaustivos, sobretudo mentalmente. As moscas zumbiam 12 horas por dia e, antes disso, nunca pensei que pudesse tolerar tantas delas. A pessoa se sente como um boxeador quando vai dormir. Mas está ainda mais cansado psicologicamente.

  Essa situação melhorou com o tempo?  

Comecei a ver pastores de ovelhas e camelos e outros familiares dos sequestradores, meninos pastores no último mês de cativeiro. Eu tinha a permissão para fazer caminhadas mais longas e para ordenhar ovelhas e camelos de vez em quando. Trocar os guardas armados por três pastores foi uma boa troca. Eles me davam leite todos os dias e me deixavam caminhar por duas ou três horas.

  Como o senhor se sente com relação a Darfur, sua população e o trabalho humanitário no geral?  

Passei cinco meses em cativeiro e, em breve, voltarei a casa para descansar, engordar um pouco e depois retomar minha vida e o meu trabalho. Parti de Darfur sem ressentimentos. Eu sinto que as verdadeiras vítimas são as pessoas que ficaram lá. Não quero que as pessoas se lembrem apenas dos últimos cinco meses (o sequestro). Durante 17 meses que passei aí antes disso acontecer, a equipe do CICV em Al Jeneina realizou vários projetos bem-sucedidos em Darfur Ocidental, em um ambiente difícil, com um número limitado de incidentes relacionados com a segurança. É assim que quero ser lembrado pela equipe do CICV.

  Algumas palavras especiais?  

Queria deixar meus sinceros agradecimentos a todos meus colegas do CICV que trabalharam duro para conseguir minha liberação e todos os que manifestaram sua solidariedade e enviaram mensagens de coragem. Muito obrigado a todas as pessoas do governo sudanês e às autoridades que trabalharam para que eu fosse liberado.